segunda-feira, 30 de maio de 2011

Jornalista estadunidense conhece "berço" do MST

Lynette (ao centro) em visita ao 1º de Agosto
Nada melhor para uma jornalista estrangeira que busca conhecer a caminhada dos movimentos sociais de luta pela terra do que pousar na região Oeste do Paraná, a terra vermelha que foi o berço da criação do MST, em 1984, no auditório do Centro Diocesano de Formação de Cascavel. 

Nada melhor do que pisar em solo minado pelo lobby de ruralistas e setores do agrobusiness e seus porta-vozes da mídia tradicional. Foi o que fez Lynette Wilson, editora da agência de notícias da Igreja Anglicana de Nova Iorque (Episcopal Life Media) e repórter do jornal The Epicospal New Yorker. A jornalista visitou na semana passada acampamentos e assentamentos do MST em Cascavel. 

Durante a produção de uma reportagem sobre os movimentos sociais, ela também conheceu a hospitalidade e religiosidade de um povo tradicional de nossas terras, os indígenas Guarani, durante um ritual na Opã (casa de reza) da Tekoha Renda Poty, aldeia no município de Santa Helena. 

Acompanhada do bispo da Arquidiocese Anglicana de Curitiba, Dom Naudal Gomes, do reverendo Luiz Carlos Gabas (de Cascavel) e do missionário Michael Tedrik, a jornalista iniciou seu roteiro por um acampamento do MLST às margens da BR-369, em Corbélia. Em Santa Tereza do Oeste, a comitiva visitou o assentamento Olga Benário e, em Cascavel, estiveram no acampamento 1º de Agosto e no assentamento Valmir Motta, nome dado em homenagem ao sem-terra conhecido como "Keno", morto em um confronto com seguranças-milicianos na antiga estação da multinacional Syngenta. 

Projetos relacionados à agroecologia e a produção de alimentos sem uso de agrotóxicos, além da organização dos acampados e assentados por meio das "brigadas" foram alguns temas que chamaram a atenção da jornalista estadunidense nas entrevistas feitas com os sem-terra. Porém foi a educação que mais impressionou Lynette. Ela conheceu o projeto político-pedagógico das Escolas Itinerantes que, fugindo da lógica da educação formal trabalha a coletividade, em contraponto à escola capitalista que trabalha a individualidade de seus educandos. 

Esse blogueiro acompanhou parte do roteiro e aproveitou para bater um papo com a jornalista sobre algumas de suas impressões. A "prosa" contou com a ajuda da tradução da professora de inglês, Priscila Carvalho de Cruz, que também serviu de intérprete nas visitas aos acampamentos. 

Qual o motivo da visita à região Oeste do PR? 
[Lynette] Essa visita tem o objetivo de fazer uma reportagem para nossa agência de notícias da Igreja Anglicana e repassar algo aos norte-americanos, pois eles não entendem com funcionam os movimentos sociais e o envolvimento da Igreja com esses povos. 

Qual a visão dos estadunidenses em relação aos movimentos sociais? 
[Lynette] Eles não têm uma visão formada, pois não conhecem. Não há movimentos similares como esse [MST], especialmente os jovens, que por lá não costumam se organizar. Então essa é uma oportunidade de um outro continente conhecer e aprender algo com o movimento. 

Qual visão a Lynette leva dessas visitas? 
[Lynette] Na visita aos indígenas fiquei impressionada com a religiosidade. Já em relação ao movimento sem-terra o que me chamou mais atenção foi a organização, de como as pessoas estão envolvidas com o movimento, desde os jovens, especialmente por meio da educação dentro dos acampamentos. Acho importante esse ensino e a coragem de lutarem contra a monocultura, formando para a plantação sem o uso de agrotóxicos.

Jornalista norte-americana conheceu Escola Itinerante do MST

domingo, 29 de maio de 2011

A balada de José e Maria

Ainda sobre o tema Código do Desflorestamento, que abriu alas para "festas democráticas regadas a pão, circo e Cohiba", reproduzo um texto do jornalista Leandro Fortes, publicado originalmente no sítio da Carta Capital e no blog http://brasiliaeuvi.wordpress.com/

 José Roque dos Santos, 59 anos, e Maria do Socorro Diniz, 58 anos, o casal das fotos ao lado, não têm escolaridade, nem terra, nem futuro algum. São dois lavradores de Doverlândia, um município perdido de Goiás, de pouco mais de 7 mil habitantes. À meia noite de segunda-feira, 23 de maio, o casal foi colocado dentro de um ônibus com outras 30 pessoas e, em troca de lanche e uma camiseta, foram enviados pelo sindicato rural local para Brasília, a seis horas de viagem de lá. José e Maria se juntaram, então, a outras centenas de infelizes enviados à capital federal pela Confederação Nacional de Agricultura (CNA) para, exatamente como gado tocado no pasto, pressionar os deputados federais a votar a favor do projeto de Código Florestal do deputado Aldo Rebelo, do Partido Comunista do Brasil.

Conversei com o casal enquanto ambos, José e Maria, eram obrigados a segurar cartazes pela votação do texto de Rebelo, defendido por figuras humanas do calibre da senadora Kátia Abreu, do DEM de Tocantins, presidente da CNA, e do deputado Ronaldo Caiado, do DEM de Goiás, ex-presidente da União Democrática Ruralista (UDR), velha agremiação de latifundiários de inspiração fascista.

José e Maria não sabem ler e nem têm a menor idéia do que é o Código Florestal. Quando lhes perguntei a razão do apoio ao projeto, assim me falaram:

José – Acho que vai ser bom pra nós e pros nossos netos, foi o que disseram.

Maria – É pra cuidar das terras, do futuro do Brasil.

Afora isso, não sabem nada. Nem uma pálida idéia do que é o projeto de Aldo Rebelo, muito menos o que é reserva ambiental e mata ciliar. Nada.

Os cartazes, me contaram, foram entregues por um certo “Luís, do sindicato dos fazendeiros” de Doverlândia, também responsável pela distribuição das camisetas da CNA. Eles foram embarcados em direção a Brasília sem chance de contestação. Os dois não têm um único centímetro de terra, mas trabalham na terra de quem manda, no caso, um fazendeiro da região. Enfrentaram um frio de 9 graus na viagem até Brasília, tomaram café com leite e pão em barraquinhas armadas em frente ao Congresso e, quando os encontrei, tomavam conta da fila de doces, frutas e confeitos que a CNA havia preparado na entrada da Câmara dos Deputados para impressionar a mídia. Tinham esperança de conseguir um almoço de graça e se mandar de volta para Doverlândia, às 17 horas de terça-feira, dia 24, a tempo de dormir em casa. Triste ilusão.

As gentes usadas como gado pela CNA para garantir a aprovação do projeto de um comunista ficaram enfurnadas no Congresso até tarde da noite, famintas e exaustas, obrigadas a se espremer nas galerias e a servir de claque contra os opositores do Código Florestal. E, é claro, a aplaudir Ronaldo Caiado.

Que essa perversão social ainda exista no Brasil, não me surpreende. Há anos tenho denunciado, como repórter, esse estado de coisas.

O que me surpreendeu mesmo é que os deputados do PCdoB não tenham se retirado do plenário, senão por respeito a José e Maria e à história do partido, mas ao menos por vergonha de serem cúmplices da miserável escravidão a que o casal de Doverlândia e seus companheiros da terra foram submetidos em troca de lanches e camiseta.

*Leandro Fortes é jornalista, professor e escritor. Autor dos livros Jornalismo Investigativo, Cayman: o dossiê do medo e Fragmentos da Grande Guerra, entre outros.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Seminário 140 anos da Comuna de Paris

A CUT-PR (Central Única dos Trabalhadores do Paraná), a APP Sindicato e o Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região realizam nesta sexta-feira, dia 27, o Seminário Comuna de Paris, em memória aos 140 anos de uma das maiores experiências democráticas da história.

As jornadas parisienses de 1871 culminaram com a constituição do primeiro (e único) governo da classe trabalhadora, uma democracia concebida pelo povo e para o povo, diferente de nossas falsas democracias modernas, regimes que servem os interesses de grupos específicos em detrimento ao conjunto dos interesses populares.

A Comuna teve vida curta, durou pouco mais de dois meses e foi logo massacrada pela tropas francesas com a ajuda de Bismarck. Veja o medo que um governo operário - legitimamente de esquerda - causava nas classes privilegiadas, visto que dois exércitos até então em guerra (França e Prússia – atual Alemanha) se uniram extraordinariamente para destruir o levante dos trabalhadores parisienses. Calcula-se um saldo de 30 mil comuneiros mortos, em execuções sumárias, sem qualquer tipo de julgamento.

Mesmo durando pouco e sendo esmagado, o governo operário em Paris deixou suas marcas, especialmente na educação, com a adoção da obrigatoriedade tanto para homens como para mulheres, adoção da escola mista e laica, além de uma de suas primeiras ações ter sido o aumento de salários dos professores, categoria supervalorizada pelo governo proletário.

Além disso, a Comuna adotou algumas leis como a constituição de eleições diretas para cargos como juízes, até então escolhidos por meio de negociatas ou "heranças naturais", além de equiparações entre salários, sendo que um operário passou a ganhar o equivalente a um burocrata estatal. A Comuna desacreditava o parlamentarismo, a institucionalidade burguesa, a política deformada pela corrupção.  

Os comuneiros implantaram uma democracia genuinamente participativa, onde elites não gozavam de privilégios e onde a classe trabalhadora não estava a mercê da lógica da representatividade partidária.  

Em seu livro a Era dos Impérios, o historiador Eric Hobsbawn, afirma que a Comuna de Paris teve “efeitos significativos sobre as elites econômicas que observaram organizações emergirem de modos cada vez mais radicais e dispostas a lutarem por uma nova sociedade”.
 
O Seminário Comuna de Paris acontecerá das 14h às 19h30, no Auditório do Espaço Cultural dos Bancários de Curitiba. É uma grande oportunidade para os moradores da capital do Estado e aqueles de passagem pela cidade conhecerem um pouco dessa grande experiência da classe trabalhadora.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Festa democrática é com pão, circo e Cohiba

Vai um Cohiba aí? (Charge de Rafael Balbueno)
Imaginem o festerê que adentrou a madrugada desta quarta-feira, dia 25 de maio, em nossa Capital Federal. Sejam elas nos restaurantes luxuosos, mansões de parlamentares e grandes latifundiários ou em casas noturnas de jogos de azar e sorte no “amor”. 

Dá até para ouvir o barulho das pedras de gelo buscando espaço no cristal com scotch, entre um diálogo e outro de Caiado com Rebelo, que como um  legítimo "comuna" acende um charuto cubano entregue pelo tampinha arretado, neto do painho coronel. Se imaginando em Sierra Maestra, Aldo dá uma bela baforada no Cohiba em nome da "revolução" e cantarola o hino da Internacional Ruralista. 

Em outro cômodo, Vacarezza, o nobre líder de nosso governo progressista, bate um papo descontraído com Lupion e expõe que "antes das diferenças ideológicas deve prevalecer o interesse nacional e a justiça aos abnegados que geram riqueza e alimentam os lares desse imenso país-continente" (sic).  

Ao fundo, um parlamentar que me falha a memória de uma dessas siglas "neopentecostais" - rodeado de belas escort girls – usa a expressão "uma mão lava a outra" ao falar com um democrata sobre a absurda proposta de criminalizarem os homofóbicos. Como bons democratas que são, ambos demonizam o "bando de despudorados que não entendem o criacionismo e a ordem natural das coisas". 

Em um jogo de carteado, um pequeno grupo de célebres pé-vermelhos da bancada ruralista – aquilo que representa o que há de mais moderno em nosso Congresso (junto com a galera das "neos") – fala ironicamente sobre o anúncio seguido de vaias da morte de mais um ecochato, sem esquecerem do assassinato de Chico Mendes que está perto de completar bodas de prata. Bodas? Bom, deixa para lá... truco, 6, cala a boca papudo!

Enquanto isso o rol de petistas mercantilizados - que abominam luta de classes e acreditam na composição (assim como o tio Getúlio) - discorrem sobre a tal "governabilidade", tudo em nome dessas sete sílabas que formam esse palavrão que serve de senha para "fidelidade aos financiadores de campanhas" ou blindagem para algum consultor.

Voltando ao tempo, ainda na terça-feira à noite (dia 24), – antes de toda essa Sodoma pública – uma passadela de nossos personagens no Congresso Nacional, na teórica "casa da democracia" que ganhou viés de coliseu do Império Romano, onde imperava o panis et circenses, o pão e circo para os mortais. Antes do veredicto final na arena dos leões, alguns fanáticos resolvem intervir e obstruem em defesa da família, ante a peste espalhada pelos sem moral nesse Estado laico e pagão. 

Após muito proselitismo de carolas caricatos, eis que 140 excelentíssimos dão seu aval aos predadores do império e saúdam o deus mercado das commodities, simbolizada nas figuras de grandes empresas de agrotóxicos e insumos, financiadoras de campanhas. Do outro lado da arena, 63 são considerados traidores do desenvolvimento da nação.

E como nem só de protagonistas, predadores e traidores vive o espetáculo e como pão e circo só se propaga com uma plateia doutrinada e domesticada por uma bela comunicação de massa, após a madrugada dionisíaca, nossos defensores da nação se regozijam como hienas nas páginas das mídias oficiais e repercutem o último texto de Kátia, a colunista da UDN, que versa sobre a "festa democrática em nosso Estado de direito".

Raio X do Código: algumas considerações

Ilustração de Eugênio Neves
Não posso me furtar de comentar alguns fatos referentes à votação do Código do Desflorestamento ocorrida na noite desta terça-feira (24) no Congresso. Algumas particularidades e considerações merecem serem citadas por esse sítio.

Goleada do latifúndio e do agrobusiness com a ajuda do governo federal, que fez o papel do árbitro que puxa sardinha para o time da casa. A pressão da torcida e dos dirigentes foi grande. Os motivos, ah os motivos... ao fim do jogo, 140 pelo "SIM" e 63 pelo "NÃO", além de um tucano em cima do toco, ou melhor do muro.

Alguns partidos foram unânimes no voto pelo "SIM" ao Código dos Negócios: Puxando a fila o PCdoB (do relator), o morimbundo DEM, o PMDB (dispensa qualquer comentário), além dos fisiológicos PP, PTB, PRB, PMN, PHS, PRP, PRTB, PSC e PTdoB.

Apenas duas bancadas foram unânimes nos votos pelo "NÃO" ao Código das Anistias: o PSOL e o PV. Vale lembrar que o PSOL é aquela legenda que muitos enchem o peito para dizer que faz o jogo da direita ao atacar alguns desmandos petistas. Com a palavra, os governistas.

Mas é preciso ser justo, o PT merece um capítulo à parte por causa de seus “dissidentes”: a maioria dos petistas votou pelo "SIM", mas 34 deputados da sigla votaram em defesa da preservação. Menção a outros dissidentes em suas bancadas: no PDT (4), PSB (3), PPS (2), PR (2), PSC (1), PSDB (1).

Um dos dissidentes do PPS é o ex-comuna Roberto Freire, que conseguiu ficar mais à esquerda que a maior parte dos parlamentares petistas e dos seguidores do Aldo no PCdoB. Lênin e Trotksi devem estar se revirando em seus túmulos. Grande ironia do destino.

O gaúcho José Stédile (PDT) votou pelo "SIM". A ovelha negra da família deve levar aquele puxão de orelha do irmão mais velho, João Pedro Stédile, um dos maiores críticos as alterações propostas no texto do "comuna" Rebelo.

Dos 29 deputados da bancada paranaense, apenas dois votaram contra o projeto de Aldo Rebelo: Dr. Rosinha (PT) e Rosane Ferreira (PV). E apenas 7 votaram contra a emenda peemedebista 164 que permite aos governos estaduais anistiar os desmatadores. Em nome da dupla dos pinheirais, saúdo os demais parlamentares que votaram pelo "NÃO", listados abaixo. 

Professora Marcivania (PT-AP), Arnaldo Jordy (PPS-PA), Cláudio Puty (PT-PA), Francisco Praciano (PT-AM), Lindomar Garçon (PV-RO), Padre Ton (PT-AM), Sibá Machado (PT-AM), Domingos Dutra (PT-MA), Sarney Filho (PV-MA), Artur Bruno (PT-CE), Eudes Xavier (PT-CE), Jesus Rodrigues (PT-PI), Nazareno Fonteles (PT-PI), Fátima Bezerra (PT-RN), Paulo Wagner (PV-RN), Fernando Ferro (PT-PE), João Paulo Lima (PT-PE), Paulo Rubem Santiago (PDT-PE), Amauri Teixeira (PT-BA), Luiz Alberto (PT-BA), Valmir Assunção (PT-BA), Waldenor Pereira (PT-BA), Antônio Roberto (PV-MG), Fábio Ramalho (PV-MG), Leonardo Monteiro (PT-MG), Padre João (PT-MG), Audifax (PSB-ES), Alessandro Molon (PT-RJ), Alfredo Sirkis (PV-RJ), Brizola Neto (PDT-RJ), Chico Alencar (PSOL-RJ), Chico D`Angelo (PT-RJ), Deley (PSC-RJ), Dr. Aluizio (PV-RJ), Dr. Paulo César (PR-RJ), Glauber Braga (PSB-RJ), Liliam Sá (PR-RJ), Miro Teixeira (PDT-RJ), Guilherme Mussi (PV-SP), Ivan Valente (PSOL-SP), Janete Rocha Pietá (PT-SP), Jilmar Tatto (PT-SP), Luiza Erundina (PSB-SP), Newton Lima (PT-SP), Ricardo Izar (PV-SP), Ricardo Tripoli (PSDB-SP), Roberto de Lucena (PV-SP), Roberto Freire (PSB-SP), Roberto Santiago (PV-SP), Erika Kokay (PT-DF), Reguffe (PDT-DF), Marina Santanna (PT-GO), Antônio Carlos Biffi (PT-MS), Pedro Uczai (PT-SC), Fernando Marroni (PT-RS), Henrique Fontana (PT-RS), Marcon (PT-RS), Paulo Pimenta (PT-RS) e Vieira da Cunha (PDT-RS)

Já o povo do lado de lá, grupo capitaneado por figuras como Caiado, ACM Neto, Ônix, Meurer, Lupion, Micheletto, Sperafico, além de seus parceiros menos importantes aqui do Velho Oeste não reservo nenhuma crítica, afinal apenas defenderam seus interesses particulares e de grupos que lhes colocaram dentro do Congresso Nacional.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Chacal e Dylan: poetas agitadores culturais

Desconstruir contextos ou contextualizar a construção poética, ideologia ou contra-ideologia, cultura da contracultura. Elementos que unem dois poetas símbolos da expressão libertária em uma data comum: o dia 24 de maio. Batizados Robert Allen Zimmerman e Ricardo de Carvalho Duarte, dois poetas, dois agitadores culturais.

O primeiro - que completa 70 anos - atende por Bob Dylan. É difícil falar do “Sr. Tamborim”, dispensa maiores comentários com suas canções-protesto, carregadas de instrumentos literários, poeta da contracultura que embalou a Beat Generation.

Já o segundo é enfático ao dizer que foi fortemente influenciado pelo primeiro, entre outros ícones da contracultura como Allen Ginsberg. Batizado Ricardo, pseudônimo Chacal, o poeta marginal o expoente da geração mimeografo, que completa seus 60 anos de vida.

Poeta, cronista e roteirista, esse maldito participou das principais manifestações culturais do Brasil nos últimos 40 anos. Publicou seu primeiro livro de poesias em 1971. Foi responsável por um dos momentos mais intensos da festa literária de Paraty 2007 na mesa literária Uivos. Lançou no ano passado, o livro de memórias Uma história à margem, um balanço informal de sua trajetória.

Sobre a obra de Chacal, Paulo Leminski afirmava que a palavra “lúdico” era o elemento chave. O imortal paranaense via nos poemas de Chacal “as letras de música popular, do mundo industrial e urbano que se abateu, irremediavelmente, sobre nós”. Semelhanças com as canções-poema do outro aniversariante do dia não são meras coincidências.

Como era bom
o tempo em que Marx explicava o mundo
tudo era luta de classes
como era simples
o tempo em que Freud explicava
que Édipo tudo explicava
tudo era clarinho limpinho explicadinho
tudo muito mais asséptico
do que era quando eu nasci
hoje rodado sambado pirado
descobri que é preciso
aprender a nascer todo dia
(Chacal)

Abaixo Subterranean Homesick Blues, de Dylan

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Arquétipos presenteia terceira idade

Miguel e Solange no Fringe 2011
A terceira idade de Cascavel será presenteada nesta terça-feira, dia 24, com o espetáculo teatral Sombras de um passado, do Grupo Arquétipos. A companhia - que atua de forma independente e que se dedica ao teatro popular - fará a apresentação da peça que foi um dos destaques do Fringe (Festival Nacional de Teatro) realizado em abril em Curitiba. 

O evento acontecerá no Sesc de Cascavel, a partir das 15 horas, e a entrada é gratuita. O espetáculo Sombras de um passado – encenado pelo casal de artistas profissionais Miguel Joaquim das Neves e Solange Ezequiel – aborda o sofrimento psíquico de Pedro, um homem marginalizado que migra do campo para a cidade. Às voltas com suas lembranças e fantasmas pessoais, percorre as vivências traumáticas antigas e os problemas concretos do presente. 

Além do espetáculo, serão realizados shows de poesia e músicas de autoria de Miguel. Sorteios de brindes e brincadeiras com os grupos da terceira idade também fazem parte da programação.Apesar de ser voltado à galerinha da terceira idade, Miguel aproveita para convidar os mais jovens para também participarem, promovendo assim a integração entre as "turmas". 

Como de praxe, esse será mais um evento cultural promovido pelo casal de artistas sem contar com o apoio de nenhum "centavo oficial". Miguel e Solange contaram apenas com a ajuda de alguns empresários da cidade, uma rotina que já faz parte da vida desses batalhadores da cultura no "velho oeste". 

Apesar da falta de apoio e valorização, o poeta Miguel é um entusiasta quando o assunto é a arte: “A arte é uma forma de quebrar barreiras e incentivar as novas descobertas, a arte por si só tem que ser livre, tem que ir além dos formatos, concretismos e metodologias aplicáveis, tem que ser apenas arte, pois ela tem o poder de revolucionar ideias, despertar censo crítico e mostrar possibilidades que existem em cada um”. 

domingo, 22 de maio de 2011

Heros Dellavega: talento do "velho oeste"

O velho oeste paranaense é um celeiro de artistas que atuam de forma independente. Talentos de nossa terra dos quais temos que nos orgulhar, artistas profissionais que muitas vezes precisam nadar contra a maré em uma região onde a cultura ainda é subvalorizada, vista como algo secundário.

Como esse sítio busca valorizar a arte e cultura - especialmente a independente - nossa porteira está escancarada para esses profissionais. Quero tomar a liberdade de falar de um grande artista que, acima de tudo, é um camarada pessoal desse escriba: o violeiro Heros Dellavega.

Natural de Cascavel, Dellavega cada vez mais vem adquirindo respeito e carinho por onde passa levando sua arte. Com sua música serena, repleta de poesias e harmonias vivas, o violeiro vem conquistando admiradores dos mais variados estilos, desde o caboclo simples até o mais “letrado”, com composições que fazem um casamento perfeito entre as letras de forte conteúdo e a harmonia dos acordes de sua viola.

Cantor, compositor, instrumentista, poeta, produtor e pesquisador da música popular brasileira, Heros Dellavega – atualmente com 31 anos – escreve poesias desde criança e compôs sua primeira canção aos 9 anos, a Jatazá do Miumbeiro. Aos 18 anos, iniciou sua carreira profissional.

O talento desse caboclo pode ser visto na produção de seu primeiro álbum, O Compositor da Lua, lançado no fim de 2010 e elogiado por grandes nomes da MPB, como Almir Sater. O cascavelense promete repetir a dose em mais uma obra que vem produzindo de maneira independente, o álbum instrumental Magia das águas, que terá 12 músicas inéditas, executadas em várias afinações da viola.  

Dellavega foi destaque em novembro de 2010 na emissora Record News, sendo premiado como artista revelação, melhor interpretação e clipe do ano de 2010 entre mais de 11 mil inscritos pela internet, no quadro talentos do programa Marco Camargo Entrevista. O apresentador e produtor musical rasgou elogios ao compositor paranaense, ao acompanhar sua interpretação de Tocando em frente (de Almir Sater), gravada no Lago Municipal de Cascavel.

Eleito pelos três maiores sites de cifras e tablaturas do Brasil (Cifra club, Vagalume, Pegacifra), como melhor arranjo, cenografia, interpretação e melhor vídeo aula para quem baixar a música Sina de Violeiro do cantor e compositor Renato Teixeira. Classificado pelo portal UOL em 3º lugar entre os artistas solo no seguimento da música folk brasileira, ficando atrás apenas de nomes consagrados como Renato Teixeira e Almir Sater.

Questionado por esse blogueiro sobre a importância dos meios de comunicação na divulgação dos artistas independentes, o violeiro considera essencial o apoio à cultura, mas desabafa quem sem sempre é assim: “Eu batalho muito para ter essa parceria ao meu lado, porém, nem sempre são positivas as respostas finais”. 

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Tarso de Castro: o sedutor subversivo

O "guerrilheiro" Tarso e Candice
Uma das coisas que me deixa irritado é economia de opiniões. Para que poupar se a fonte é infinita. Se os posicionamentos farão desafetos ou admiradores é consequência. Assim pensava um jornalista que marcou história nas décadas de 60 e 70 no Brasil do AI-5.

Em 20 de maio de 1991, Tarso de Castro partiu para tomar seu “drinque no inferno”. Gaúcho de coração e carioca por vocação, foi um dos criadores de O Pasquim, jornal que fez história ao ser concebido na égide dos anos de chumbo da ditadura milico-empresarial. É de Tarso, o DNA sarcástico e debochado do semanário. 

Polêmico, brigão e subversivo, Tarso era daqueles "malditos" que fechava bares, alugava carros e aprontava em hotéis de luxo, ao melhor estilo Gonzo. Comprou brigas homéricas pelas redações que passou – com diretores e editores – mas nem mesmo os amigos mais próximos escapavam de seu temperamento tempestuoso.   

Um "enigma" sempre foi uma pulga atrás das orelhas de seus camaradas: o charme do maldito. Mesmo desajeitado, feio, desleixado consigo mesmo e sem onde ter para cair morto, tinha em seu currículo um rol de casos com belas mulheres. De uma dessas aventuras, uma história ao "estilo Tarso" em seu namoro com a atriz estadunidense Candice Bergen. 

O jornalista adorava exibir uma fotografia pessoal ao lado do revolucionário Che Guevara. Já a atriz se vangloriava de “ter ficado com um guerrilheiro que participou da revolução cubana”. A pobrezinha – que dizem as más línguas – fazia mais sucesso pela beleza do que outro atributo, caiu no "conto do malandro". A foto foi tirada por Tarso na condição de entrevistador quando o argentino esteve em visita ao Brasil. 

Após seus 30 anos ininterruptos de álcool e sua oitava hemorragia interna, Tarso foi tomar seu scotch em outro universo. O dia: 20 de maio de 1991. Uma morte que não surpreendeu os mais próximos, pois ele mesmo pregava que “após os 40 anos a vida não teria mais graça”. Viveu nove a mais do que o limite. 

Seu corpo foi transladado para Passo Fundo, sua cidade natal. Lá um personagem símbolo dos anos de chumbo lhe esperava: Romeu Tuma, então superintendente da Polícia Federal, que disparou: “Restos mortais de um subversivo boca suja”. 

Tuma tinha razão, pois Tarso subverteu o jornalismo. Nas palavras de Otto Lara Resende “Tarso tinha defeitos visíveis e qualidades nem sempre visíveis, sobretudo para quem o via de longe, ou o sofria de perto”.

"Devo ter todos os defeitos possíveis, mas faço questão de exercer minhas virtudes"
Tarso de Castro

terça-feira, 17 de maio de 2011

Nakba: a Intifada midiática prossegue

Ilustração de Carlos Latuff
Em março do ano passado, quando da visita de Lula ao Oriente Médio, escrevi um artigo intitulado “A Intifada e as gafes”. Na época, nosso ex-presidente foi massacrado pela grande mídia que considerou sua visita um fracasso para as relações exteriores.

Grandes órgãos da “mídia limpinha” – que tem juízos de valores reproduzidos em meios regionais e locais - consideraram uma gafe a recusa de Lula em visitar o túmulo de Theodor Herzl, o pai do sionismo, movimento que criou o Estado de Israel.

Para quem não sabe o sonho de Herzl, o cara da “gafe de Lula”, era fazer valer um intitulado “direito ancestral” de seu povo por meio de colonização de terras, que se transformou em uma espécie de “limpeza étnica”. Esse processo começou ainda 1882, data do primeiro assentamento sionista em território palestino. 

A decisão de Lula em não visitar o túmulo foi encarada como afronta pela horda de moralizadores de ocasião, que aproveitaram a oportunidade para descer a ripa no então “presida”.

Pois bem, o artigo de 2010 me veio à lembrança nesse fim de semana, oportunidade onde os palestinos lembraram do Nakba, o êxodo palestino ocorrido em 1948. O termo Nakba significa catástrofe – que teve início quando mais de 700 mil palestinos tiveram que fugir de suas terras em decorrência da perseguição de tropas do Estado de Israel. Após os acontecimentos, o governo de Israel implantou uma série de leis para impedir a volta desses palestinos, como também impedir que eles exigissem seu direito a propriedade. 

Atualmente são cerca de 4,5 milhões de refugiados palestinos e seus descendentes. Nos dias da lembrança do Nakba (de 13 a 15 de maio), os palestinos reivindicam seu direito de voltar a sua terra e que se faça cumprir por parte de Israel, a resolução 194 da ONU, que garante direito de regresso dos refugiados. 

Como de praxe, as “comemorações” do Nakba são duramente repreendidas pelo Estado de Israel e, nesse fim de semana, não foi diferente. As manifestações foram contidas por meio da força, o que a grande mídia limpinha (de mitos como da "imparcialidade") pautou como “confronto” entre israelenses e palestinos, mesmo o embate sendo de pedras contra tanques e helicópteros de um dos exércitos mais bem equipados do mundo.

Centenas de feridos e presos e até o momento - pelo que sabe - 16 palestinos foram mortos. De acordo com as fontes israelenses, os “manifestantes teriam sido mortos por estarem atirando pedras”.

Enfim, voltando ao artigo “A Intifada e as gafes” – feito em março de 2010 – falei sobre uma verdadeira “intifada midiática”, quando se trata do complexo conflito envolvendo palestinos e israelenses. Uma intifada que segue tentando descontextualizar fatos. Isso fica explícito na postagem do blog do Jornalismo B (@jornalismob) “Dezesseis palestinos mortos: confronto ou massacre? http://bit.ly/iRIL9z que apresenta uma clipagem das manchetes de grandes jornais e emissoras de televisão. 

Mais detalhes sobre o Nakba, no vídeo sugerido pela amiga jornalista Carol Wadi



Quem quiser conferir o artigo "A Intifada e as gafes", publicado na Gazeta do Paraná e reproduzido pelo Observatório da Imprensa, o link é:  

Outra sugestão para os seguidores do Sítio é o documentário: Peace, Propaganda & the Promised Land

Esforço para votar PEC do Diploma

Via Sindijor-PR

O presidente do Sindijor-PR (Sindicato dos Jornalistas do Paraná), Márcio Rodrigues, seguiu nesta terça-feira (17) para Brasília para integrar o esforço da Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) em convencer os senadores a votar a PEC 033/09, que estabelece a volta da obrigatoriedade do diploma de Jornalismo para o exercício da profissão.

A intenção do movimento dos jornalistas é de que o projeto seja votado hoje ou amanhã. Por isso, é fundamental que toda a categoria se mobilize para pressionar os parlamentares que votem – e favoravelmente – a PEC nesta semana. A matéria deveria ter sido colocada em primeira discussão na quinta-feira passada, mas teve que ser adiada por que a pauta estava trancada por votação com regime de urgência.

A PEC do Diploma já possui intenção de voto favorável da maioria dos senadores – pela contagem da Fenaj, 72 senadores são favoráveis, seis são contrários e três ainda estão indefinidos.

*    Vale lembrar que entre os senadores paranaenses, Alvaro Dias (PSDB) e Gleisi Hoffmann (PT) se posicionam favoráveis, enquanto Roberto Requião (PMDB) é contra

segunda-feira, 16 de maio de 2011

O blogueiro Esmael e a lição de Rousseau

Às vésperas do 40º dia de censura de seu sítio na internet, o blogueiro Esmael Morais ganhou voz por meio de uma rede solidária de blogs, portais, jornais e ferramentas como twitter e facebook, que reproduzirão sua coluna. São mais de 400 páginas, todas contrárias a ação orquestrada a pedido do governador Beto Richa, que tirou do ar (pela 5ª vez) a página: http://esmaelmorais.com.br/.

Muitos devem conhecer a saga desse blogueiro dos pinheirais, considerado pelo tucano um de seus “inimigos públicos”. Só esse fato já me soa estranho; um governador de um Estado tão importante, considerado o “melhor prefeito das galáxias”, preocupado com um blog, justo um blog, ferramenta por vezes ignorada e desacreditada por uma série de políticos – que ainda acreditam que a liberdade de expressão se reflete em sua essência na mídia tradicional, sua eterna aliada comercial e editorial.

Incomodado com a exposição de uma série de denúncias que vão desde o enterrado caso “Betogate” em sua reeleição na capital até o impedimento da divulgação de uma série de pesquisas eleitorais na disputa ao Governo do Estado, o tucano apelou à nossa Justiça, que investiu e interviu contra a liberdade de expressão.

Dentro desse cenário, um ponto em especial chamou minha atenção. Parafraseando Luther King: “o silêncio de alguns bons”. Foram centenas de contrários à ação – prova disso é a reprodução em massa da coluna do blogueiro a partir dessa segunda-feira – porém percebi que muitos colegas da imprensa tradicional, assessores políticos e até mesmo nossa entidade representativa de classe (a qual pertenço) não deram a devida importância a situação como deram a outros casos de ferimento da liberdade de expressão (de não menos gravidade por sinal).

A censura ao blogueiro foi por vezes minimizada e descredibilitada, talvez pelo personagem central ser o manager do Estado, tão querido da mídia tradicional (nós aqui do velho oeste que o diga). Imagino a reação se o blogueiro fosse outro, ou melhor, se o manager fosse alguma persona non grata da mídia. Talvez egos seriam feridos com maior facilidade e o “corporativismo apaixonado de classe voltaria a cena”.

Não se trata de gostar ou não do blogueiro Esmael (o qual não conheço pessoalmente), trata-se de ir contra a ação política, à arbitrariedades que atentem contra a liberdade de expressão protagonizada por um representante de voto popular, seja qual sigla ou cargo ele carregue.

Beto tentou calar Esmael, mas o feitiço se voltou. Nosso manager deu margem para sua voz ser replicada por centenas em uma rede solidária. Será que todos esses reprodutores sofrerão intervenção da Justiça ou será que, enfim, alguns políticos aprenderão a lição de Rousseau: “posso não concordar com uma palavra que dizes, mas defenderei até a morte, o direito de dizê-la”.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Wanda Sykes - Gay vs. Black (Legendado)

Em tempos de racismo e homofobia (sejam velados ou não), de resgate de valores amparados em lemas como "tradição, família e propriedade", personagens caricatos como T-Rex Bolsonassauro e Malacabado Malafaios, parlamentar usando tribuna para dar sermão, proselitismo religioso via TV, rádio ou outdoor e um humor de gosto "duvidoso" para massagear egos classistas, indico como antídoto um vídeo da atriz e comediante estadunidense Wanda Sykes, uma lição do verdadeiro stand-up comedy. Humor com inversão de papéis para mostrar que qualquer forma de preconceito é abominável.  

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Pergunta infantil: "Pai, porque a gasolina é tão cara?"


Reproduzo abaixo um artigo enviado pelo camarada e escritor Alceu A. Sperança sobre essa "onda de protestos" da série #PreçoJusto e #NaMesmaMoeda. Vale a pena conferir e, principalmente, refletir. 


 Então o moleque volta da escola, depois de ter visto uma carreata de irados jovens ouvindo seus sertanojos e bate-estacas, entornando vodca dos jeitos russo e alemão*, protestando, indignados, contra o reajuste da gasolina.

Eles se omitem completamente da ação política em sua comunidade e entregam seu destino a governantes e parlamentares com base na propaganda e não na avaliação ideológica. Ignoram a realidade da exploração feroz feita sobre o povo e os recursos naturais do Brasil e, de quebra, não têm muita experiência nesse lance de protestos.

Mas decidiram finalmente protestar, ainda que com seu jeito de samba atravessado. Protestar não contra as causas do aumento da gasolina, que por omissão e analfabetismo político igualmente ignoram, mas contra os postos, que lhes prestam serviços e pouco influem, a não ser quando se metem em cartéis, na formação do preço do combustível ao consumidor.

Fazem negócios em que ganham até o dobro do que investem, pagam sem bufar 40% de sua renda familiar em impostos e taxas e votam maciçamente nos partidos do governo e da oposição que já foi governo antes e fez a mesma coisa quando reinou.

Mas não aceitam que a gasolina também pague 40% entre impostos e taxas, embora eles mesmos paguem até mais de 40%. Quando vão protestar nos postos, que também gastam 40% de sua renda em impostos e taxas, enquanto recebem 8% do valor pago pelo litro, não é quem criou a elevada carga tributária que recebe protestos: quem atura os protestos indignados são os comerciantes dos postos.

Está na cara: esses protestos sem nenhum sentido nem resultado feitos nos postos de abastecimento são puxados por espertíssimos governistas de hoje e malandros governistas de ontem.

Com isso, os dois bandos mantêm a população na ignorância sobre as verdadeiras causas do preço da gasolina ser tão alto: a bovina submissão dos governistas de hoje e dos governistas de ontem às regras do jogo fixadas em algum lugar entre Wall Street e a City.  

Mas aí seu filhinho colegial começa a crivá-lo de perguntas:
– Pai, por que a gasolina é cara?
– Porque grande parte do preço é formada pelos impostos altos.
– Por que os impostos são altos?
– Para pagar o serviço da dívida de quase dois trilhões. Uma pequena parte do que é arrecadado volta ao povo em obras e programas sociais, mas o grosso é para pagar essa dívida. Coisa de cinco a dez bilhões por mês, no mínimo.
– Por que a dívida é tão alta?
– Para enriquecer os banqueiros, que mandam no Brasil, repartindo o poder com as multinacionais, máfias e ruralistas. Mas o Brasil nunca paga a dívida, porque eles não querem que o Brasil pague. Só cobram uma parte dos juros e assim a dívida continua crescendo. É por isso que pagamos cada vez mais. É idiotice, mas elegemos nossos governantes e representantes para fazer assim.
– Mas por que os banqueiros mandam no Brasil?
– Porque o capitalismo domina o Brasil e o mundo, com seu imperialismo. Capitalismo é um jeito maroto de fazer os outros trabalhar e você ganhar mais que eles, que não fazem nada. Imperialismo é um país rico achar que é melhor que um país pobre e escravizar o povo do país pobre.
– Porque o capitalismo e o imperialismo dominam o mundo?
– Porque tem babaca como eu que fica de braços cruzados, só pagando impostos, sem fazer nada pra mudar...

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O jeito é sair do sufoco dessas perguntas impertinentes e entrar na carreata de protesto contra o aumento da gasolina. Marcho indignado para o posto, onde vou buzinar e gastar mais gasolina a cada aceleração.

“Por que protestar no posto?”, imagino meu filho perguntando. Pura covardia: se for protestar nos palácios, nossos “líderes” mandam a PM me descer a borracha. Dono de posto não quer perder cliente: ouve e fica quieto.

Epa, lá vem meu filho correndo atrás do carro para me fazer mais uma pergunta incômoda:
– Pai, por que o lotação é tão caro?...
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*O jeito russo de beber é pela boca. O jeito alemão me deixa ruborizado quando tento explicar como é... Mas é o seguinte: nas lojas de inconveniências, as garotas sugam o álcool pelas partes pudendas da frente e os marmanjos pelos fundilhos