terça-feira, 13 de setembro de 2011

Literatura: Ode a Candido, prosa com Jesus

Antonio Candido (foto: Wilson Junior/AE)
O Sesc-PR não poderia ter sido mais feliz na escolha do homenageado de sua Semana Literária de 2011. A edição deste ano – realizada entre os dias 12 e 15 de setembro - tem como tema 'Literatura e Sociedade', título que dá nome a um conjunto de artigos publicados em 1965 por Antonio Candido, considerado o maior crítico literário da atualidade no Brasil.

Escritor, sociólogo e militante histórico da esquerda brasileira, Candido é o homenageado da Semana Literária, que tem como objetivo discutir o lugar que a literatura ocupa na atualidade. Em Literatura e Sociedade, o escritor analisa a relação entre as obras e a crítica sociológica, averiguando como a realidade social se transforma em componente da estrutura literária.

Nas palavras de Antonio Candido: "toda obra é autônoma, mas formada por coisas que vieram de fora dela, por influências da sociedade, da ideologia do tempo, do autor... o importante é: quais elementos da realidade social que se transformaram em estrutura estética".
 
A análise de Antonio Candido sobre literatura parte da cultura para a realidade social e volta para cultura e para o texto. Socialista convicto, Antonio Candido destacou em recente entrevista ao jornal Brasil deFato que seu método tem forte influência marxista. "É preciso aproveitar o conhecimento sociológico para ver como isso pode contribuir para conhecer o intimo de uma obra literária", disse o crítico.

Outra característica de Antonio Candido é a clareza das palavras. Apesar de erudito, os textos do autor têm uma linguagem simples. Segundo ele, "o povo tem direito à literatura e entende a literatura. Tem que saber explicar e usar a linguagem normal", diz Candido na mesma entrevista, completando: "Trata-se de respeito pelo próximo, pelo leitor".

Militância política

Sua militância foi iniciada no período em que era aluno do curso de Ciências Sociais da USP (Universidade de São Paulo). Foi fundador da revista Clima, publicação mensal criada por um grupo de orientação anti Estado Novo e contra a ditadura de Vargas e anti fascismo na Europa. Foi um dos criadores da Esquerda Democrática, que futuramente viria a se chamar Partido Socialista Brasileiro. Em meio à ditadura militar, Candido escreveu uma série de artigos críticos ao regime no jornal Opinião. Ajudou na fundação do PT, onde militou até 2002, quando Lula foi eleito. Aos 93 anos, Antonio Candido mantém sua crença no socialismo, doutrina – segundo ele – 'triunfante'.
 
Semana Literária

Voltando a Semana Literária, a combinação cultura em praça pública + Antonio Candido fez com que eu aproveitasse o sol escaldante que beirava os 30 graus Celsius para conferir a atmosfera literária montada pelo Sesc na praça Wilson Joffre, em Cascavel. Enquanto alunos da rede particular acompanhavam uma apresentação do Grupo teatral Auto Peças (de Curitiba) bati um papo com outro Antonio, o de Jesus, um dos fundadores da Academia Cascavelense de Letras (ACL).

Iniciei a prosa me atendo ao homenageado, de quem Jesus disse ser um 'devoto', especialmente pelo "papel de ter destrinchado essa noção de literatura e sociedade enquanto produção cultural". Para Jesus, o 'Antonio homenageado' trabalha a literatura na percepção da ótica e influência do autor, de suas vivências, de sua personalidade, do momento histórico vivenciado. 

Após 'destrincharmos' Antonio Candido, me ative ao Jesus, à ACL e como ele avalia a função da literatura neste século 21, marcado pelas imagens, pela velocidade, o imediatismo e pela era da internet. Antonio de Jesus fez críticas à uma sociedade cada vez mais refém das sintetizações, usando inclusive o jargão jornalístico lead (primeiro parágrafo que busca condensar a informação básica da notícia).

Outro apontamento de Jesus foi sobre a produção literária de nossas universidades. “Temos várias universidades por aqui, mas o que produzimos de literatura nelas? Que grande escritor nasceu de dentro delas?”, questiona. Ele também alfineta os meios de comunicação. "A própria mídia trabalha pra isso. Em Cascavel, nós tínhamos apenas o ALT [antigo suplemento do jornal Gazeta do Paraná], mas que não sobreviveu nessa lógica mercantil da imprensa. Esses espaços são substituídos por cadernos sobre ‘biritas’ e baladas, pagas por casas noturnas".  

Ao final da prosa me atrevi a perguntar à Antonio de Jesus uma questão ao qual Antonio Candido é constantemente abordado em suas entrevistas à imprensa: Se nessa era virtual o livro se extinguirá? A resposta foi similar a de Candido: "Nunca, o apaixonado pelo livro sempre resistirá", profetizou Jesus.

A Semana Literária do SESC em Cascavel será encerrada na quinta-feira, dia 15. A programação completa pode ser conferida no link abaixo:

4 comentários:

  1. Concordo com Jesus. A tecnologia é superficial diante das sensações que o livro pode proporcionar.
    Ainda que a tecnologia avance cada vez mais, as pessoas vão procurar em algum momento algo que provoque a sensação da leitura.

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  2. Li muito o Antonio Candido no Opiniao e outros órgaos de imprensa nos anos 1970. Aprendi a conhecer e respeitar o dr. Jesus quando estive na Sec. de Cultura. Quando ao "gerente" deste blog, meu xará Carignano, nutro especial carinho. E tbém acho que o livro irá sobreviver a era digital.

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  3. "O povo tem direito à literatura e entende a literatura. Tem que saber explicar e usar a linguagem normal". Isso não é fantástico?

    A tecnologia, que nos aproxima de tudo e nos facilita a vida, ao mesmo tempo nos faz sintetizar coisas que deveríamos abrir espaço, como o cultivo da leitura.

    Por outro lado, acabamos conhecendo novos escritores! Já descobri alguns pela internet que depois fui atrás do livro para tê-lo ao alcance das mãos!

    Amo a tecnologia, mas não deixo de ter ao lado da cabeceira da cama um livro que trate sobre qualquer assunto!

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  4. .

    Caro Julio:

    É consolador a gente constatar que há uma juventude intelectual, no melhor sentido do termo, que transcende aos circuitos noturno-etílico-biriteiros, e que enveredando-se pelos meandros do jornalismo, o fazem com inteligência, profissionalismo e saem a campo, em busca da notícia. A propósito, essa pratica dos melhores jornais - em todos os tempos - está em processo de extinção na mídia impressa da nossa cidade, vez que os editores/redatores de arte/cultura, há muito não se dignam nem mesmo a registrarem a leitura das sugestões de pauta enviadas e/ou a concederem meia duzia de linhas para registrar um fato cultural, de qualquer natureza. Vivemos a era do copiar/colar material pronto das agências de notícias sobre eventos e temas (de variedades) do eixo Rio/São Paulo. Agradeço a atenção dada a ACL, na minha pessoa e, também, por eferecer aos jejunos em literatura brasileira, um sucinto mas bem elaborado panorama sobre a figura de Antonio Cândido, o homenageado da Semana Literária 2011 do Sesc.

    Se me permitir, gostaria de reverberar o seu texto, "Literatura: Ode a Candido, prosa com Jesus" nas publicações da nossa Academia.

    Você acaba de ganhar um leitor assíduo do seu sítio.

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