quarta-feira, 26 de março de 2014

Atlético Paranaense: 90 anos de paixão e amizade


Do alto da Rua XV de Novembro, um dos pontos mais tradicionais da capital paranaense, mas especificamente no Café do Comércio, nasce o meu mais 'velho amigo', que completa 90 anos hoje. Lá foi concebido o clube mais popular do futebol do nosso Estado, o Clube Atlético Paranaense, ou simplesmente o 'Trétis', fruto da fusão do 'rubro' América e do 'negro' Internacional.

A primeira partida oficial não poderia ser mais apropriada, pois não foi apenas a primeira vez do rubro-negro, mas o pontapé inicial para a maior rivalidade do Paraná: o ATLEtiba. Fundado 12 anos antes, o Coritiba, de alcunha 'coxa-branca', era o mais importante time do Estado, mas sucumbiu diante do 'debutante' rubro negro: 2 a 0 fora o baile!

Mais tarde, em 1949, nasce o esquadrão da dupla Jackson e Cireno, que foi primeiramente chamado de 'Tufão' pelos jornais, porém ao perceberem que o vento ainda era mais forte, recebeu o apelido de 'Furacão'. Já em 1968, entra em cena o grande Barcímio Sicupira, que não tive a felicidade de ver jogar, mas que em virtude do advento de 'novas tecnologias' como o Youtube, guardo na memória a pintura do gol de bicicleta em sua estreia contra o São Paulo, na Vila Capanema.

Se nossas famílias já amamos desde o berço, tenho que confessar que escrever sobre o Atlético é como escrever de minha 'primeira paixão'. Falar do rubro-negro é viajar no tempo e voltar ao final dos anos 80 e início dos 90. Na época já tinha plena convicção do 'uniforme de guerra' que iria usar para o resto da vida, mas foi somente nesta fase que comecei a frequentar aquele que para mim sempre foi o 'antro' mais empolgante que já conheci.

Lembro em especial de duas oportunidades; meus pontapés iniciais na antiga quadra anexa ao Joaquim Américo e principalmente ao subir a rampa do 'Caldeirão do Diabo' certa vez com meu pai e outra com meu avô, torcedores do extinto 'Boca Negra' e dos 'verdes', respectivamente, mas que não hesitavam em me levar aos jogos e treinos do time do meu coração.

Para um garoto do alto de seus 9 ou 10 anos era uma cena de arrepiar. Na rampa, aquele grande ‘CAP’ de pedra, um 'bando de malucos', com grandes bandeiras com caveiras pintadas, faixas e instrumentos de percussão. Ao começar as 'batalhas' pensava se aquelas estruturas um tanto precárias do antigo tobogã eram seguras, pois tremiam junto com a adrenalina dos apaixonados.

Arrepio maior então ao ouvir pela primeira vez - desta vez em 'campo inimigo' nas desgastadas ruínas do Major Pereira - a famosa paródia de The Wall, pois, ao mesmo tempo também começava meus prazeres pela música do 'dito cujo', o bom e velho rock n roll. Minha imaginação fluía de tal forma que conseguia visualizar Roger Waters e David Gilmour mandando em melodia a coxarada para o lugar "que é deles de direito".

Enfim, 26 de março é uma data especial, o aniversário de um 'grande amigo', que a cada encontro - mesmo a distância - extravaso com ele emoções e dou um tempo nos percalços do dia a dia. Como qualquer amigo, ele proporciona grandes alegrias e também decepções, mas como amigo fiel, não posso me furtar de perdoá-lo. Em nome desta amizade e de todos atleticanos, ficam os parabéns aos 90 anos do time de maior torcida do Paraná e a todos os fanáticos que vestem o manto rubro-negro, assim como cantado nos versos de Zinder Lins: "somente por amor".

segunda-feira, 24 de março de 2014

Caso Teixeirinha: Sem terra vão a júri popular nesta quarta-feira

Diniz Bento da Silva, o 'Teixeirinha', morto em 1993 
O caso de maior repercussão no cenário histórico de conflitos de terra que marcam a região Oeste do Paraná e que rendeu condenação ao Brasil na OEA (Organização dos Estados Americanos) terá novo capítulo nesta quarta-feira (26/03) no município de Guaraniaçu, onde será realizado o júri popular de cinco sem terra acusados da morte dos policiais militares Vicente de Freitas, Algacir José Bebber e Adelino Arconti. O fato aconteceu na ocupação da Fazenda Santana, em Campo Bonito, no dia 03 de março de 1993.

Durante a ocupação, os policiais foram até a fazenda acompanhar o madeireiro Adessir Cassol na retirada de máquinas do local. Por se tratarem de policiais à paisana (conhecidos como P2), os militares foram confundidos com pistoleiros, segundo a versão dos sem terra, que ainda alegaram que os policias teriam atirado primeiro, agindo assim em legítima defesa.

Na época, a PM fechou cerco ao acampamento dos sem terras e, segundo relatos de integrantes do movimento, torturou diversos ocupantes para que fossem revelados os envolvidos no incidente. Sete homens foram presos preventivamente e o líder dos sem terra Diniz Bento da Silva, o 'Teixeirinha' ficou foragido por cinco dias. Segundo denúncia do MST, após entregar-se desarmado aos policiais diante de testemunhas, Teixeirinha teria sido torturado e executado na frente da esposa e do filho de 13 anos no dia 8 de março de 1993.

Ainda conforme a versão dos sem terra, Teixeirinha havia se escondido da polícia, até saber que seu filho estava nas mãos dos policiais. Entregou-se, foi algemado e arrastado em direção à roça, onde moradores ouviram vários disparos de tiros. O caso teve repercussão internacional e levou o governo brasileiro a ser alvo do relatório, em 2001, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA e posteriormente ser condenado por violação do direito à vida.

Catorze policiais militares de batalhões de várias regiões do Paraná foram formalmente acusados pela morte de Teixeirinha, em denúncia oferecida à Justiça de Guaraniaçu. O processo que investigava a morte de Teixeirinha recém saiu da fase de inquérito, enquanto os sem terra irão ser julgados em júri popular.

Integrantes do MST prometem 'vermelhar' o município de Guaraniaçu para acompanhar o júri na cidade. Por outro lado, é evidente que os familiares e amigos dos policiais militares mortos deverão comparecer para acompanhar o julgamento, situação que pode acirrar os ânimos e requer atenção redobrada dos órgãos de segurança.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Comissão da Verdade realiza audiência em Cascavel

Audiência pública no auditório da Unioeste em Cascavel
A repressão agiu no interior do Paraná com prisões de lideranças sindicais, de agricultores e membros dos chamados 'Grupos dos Onze'. Pessoas que tinham em comum o fato de resistirem no período mais violento e perverso da ditadura militar brasileira, onde graves violações de direitos humanos se estenderam por todo o país. No Oeste e Sudoeste do Estado não foi diferente, ainda que a memória dominante insista no contrário, afirmando que as regiões não foram atingidas pelo regime instaurado com o golpe de 1º de abril de 1964. 

Neste sentido, de contrapor ao ideário dominante, que a Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná) recebeu integrantes da Comissão Estadual da Verdade para uma audiência pública com o objetivo de dar voz as pessoas que resistiram a ditadura ou que foram vítimas de violações. No primeiro dia de atividades, nesta quinta-feira (20/03), foram 17 depoimentos públicos de integrantes da Guerrilha de Três Passos, do movimento dos Grupos dos Onze, além de familiares de vítimas do golpe que está prestes de completar 50 anos.

Os destaques do primeiro dia de atividades foram os relatos dos irmãos Valdetar Antônio Dorneles e Abrão Antônio Dorneles, sobreviventes da Guerrilha de Três Passos. Em 17 de março de 1965, um pouco antes de completar um ano o golpe civil-militar que derrubou o governo do presidente João Goulart, o grupo constituído por 23 homens - entre camponeses, militares e profissionais liberais - de origem trabalhista/brizolista foram protagonistas da primeira ação armada contra a ditadura.

Valdetar Dorneles, ex-guerrilheiro
A chamada 'Operação Três Passos' foi a primeira ação brasileira de guerrilha rural contra o governo militar. "Participamos da primeira reforma agrária do país, feita pelo governador Leonel Brizola, iniciamos a guerrilha com um mosquete e três rifles e durante uma ação num destacamento apanhamos outros 65 rifles e munição", recorda Valdetar, que cumpriu pena em várias prisões como preso político.

Residente em Três Passos (RS), Valdetar esclareceu que a região sudoeste do Paraná foi palco de vários episódios marcantes do período. "Um dos fatos mais marcantes foi nossa passagem por Santo Antonio do Sudoeste, onde um caminhão carregado de guerrilheiros parou para abastecer. Essa região foi onde se originou o maior 'Grupo dos Onze' do país", comenta.

Submetido a violentas torturas no 1º Batalhão de Fronteiras, em Foz do Iguaçu, Valdetar ainda carrega as marcas e cicatrizes da época. "Quando vejo as marcas lembro de minha mãe me abraçando e dizendo que era melhor viver lutando do que morrer como escravo dessa cambada", recorda emocionado, e conclui: "Até hoje sofro as consequências em minha cidade, alguns dizem "lá vai o comunista que tomou Três Passos", especialmente os da elite de minha cidade". 

 
Além de heróis da resistência, familiares daqueles que lutaram contra a repressão também deram relatos públicos; entre elas a paraguaia Domiciana Gímenez Gamarra, filha de Remígio Gímenez Gamarra, preso político sequestrado por policiais na região de Vila Portes (Foz do Iguaçu) e levado à prisão em Assunção. Integrante do 'Movimento14 de Maio', Remígio fez greve de fome na prisão e seu caso foi denunciado à Anistia Internacional. À época, a mãe de Domiciana enviou carta ao general Ernesto Geisel, então presidente do Brasil. Foi um típico caso de conivência entre duas ditaduras latino americanas. 


Domiciana Gímenez, filha de Remígio Gimenez
"Os 11 companheiros"
 

Na período da tarde, os depoimentos ficaram concentrados nos integrantes dos chamados 'Grupos dos Onze'. Foram ouvidos relatos de moradores de Barracão, Santo Antonio do Sudoeste e Capanema.  A partir de outubro de 1963, sob o comando de Leonel Brizola, surgia no Brasil o movimento, de cunho nacionalista, formado de modo espontâneo. Após ouvirem conclamações do líder gaúcho pelo rádio, as pessoas, muitas delas agricultores, deslocavam-se de casa em casa buscando assinaturas para a 'lista dos onze companheiros'.

Os grupos surgem durante a chamada ‘Campanha da Legalidade’. "Inspirados no governador Leonel Brizola, formamos esses grupos de resistência para defender as conquistas democráticas e resistir as tentativas de golpe", comenta Lauro Rossini, natural de Capanema. "Nosso primeiro objetivo era discutir a reforma agrária, não queríamos derramamento de sangue, mas sim o estabelecimento da ordem e legalidade constitucional", recorda.

Segundo dia


Na manhã desta sexta-feira (20/03), será dada continuidade a Audiência Pública da Comissão Estadual da Verdade em Cascavel, com depoimentos de lideranças Guarani sobre violações contra indígenas no oeste e sudoeste do Paraná no período militar e os impactos da construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu.

Há registros documentais e relatos orais de queima de casas, ameaças e agressões físicas, com envolvimento de policiais e servidores do Incra na década de 70. Essas violências aconteceram no contexto da construção de usina durante a administração da Funai e Itaipu pelo coronel Nobre da Veiga e o general José Costa Cavalcanti.

Nestes casos há ainda registro da intervenção de agentes vinculados ao SNI e Polícia Federal. Entre os depoentes estará Onório Karai Benitez, "chamoy" (rezador) da comunidade de Itamarã, em Diamante do Oeste, além do professor Teodoro Tupã Alves. O segundo dia de trabalhos da audiência tem início às 9 horas, no auditório da Unioeste, campus de Cascavel.

terça-feira, 18 de março de 2014

Colégio com nome de ditador é "rebatizado" em Cascavel

Estudantes homenagearam o estudante Edson Luis [foto: Júlio Carignano]
O Colégio Estadual Presidente Costa e Silva, no Jardim Maria Luiza, em Cascavel, foi ‘rebatizado’ nesta terça-feira (18/03) com o nome de Edson Luis de Lima Souto, estudante assassinado há 46 anos durante os chamados ‘anos de chumbo’. A ação simbólica é alusiva aos 50 anos do golpe que instaurou o regime militar em 1º de abril de 1964 e faz parte dos atos que antecedem a audiência pública da Comissão Estadual da Verdade em Cascavel, que será realizada nos dias 20 e 21. 

Ainda que não tenha validade legal para mudança de nome do colégio, uma vez que para isso é preciso uma legislação ou decreto governamental, o ato foi uma tentativa de reescrever a história, denunciando àqueles que foram agentes de um dos momentos mais tristes da história de nosso país, como explica Elio Ribeiro Junior, presidente da ACES. “Esse é um ato de repúdio contra um ditador fascista que nunca pagou pelos crimes que cometeu e uma homenagem ao Edson Luis, um símbolo da resistência contra a ditadura”, explica Juninho, como é conhecido o novo presidente da entidade secundarista. 

Edson Luis tinha a mesma idade que Juninho, 18, quando foi morto, e assim como o cascavelense, também atuava em uma entidade estudantil municipal. O assassinato do secundarista, em 28 de março de 1968, durante conflito entre estudantes e policiais no restaurante Calabouço, no centro do Rio de Janeiro, foi um dos marcos na luta contra a ditadura militar, causando uma grande comoção pública. O também estudante Benedito Frazão, também foi atingido na ocasião e morreu no hospital.

Após ser morto, Edson Luis teve seu corpo levado por estudantes até a Assembléia Legislativa do RJ e velado à noite. Mais de 50 mil pessoas compareceram ao enterro, entoando gritos de ordem contra o governo e a violência e uma delas se espalhou nas faixas, cartazes e na boca do povo carioca: “Mataram um estudante. Podia ser seu filho!"”. O velório foi cercado pela PM, agentes do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social) e militares que provocavam os manifestantes com bombas de gás.

Costa e Silva 

O Marechal Artur da Costa e Silva, militar e político da Arena (Aliança Renovadora Nacional) foi o segundo presidente do regime militar, no período entre 5 de março de 1967 e 31 de agosto de 1969. Seu governo iniciou a fase mais dura do regime ditatorial, à qual o general Emílio Garrastazu Médici, seu sucessor, deu continuidade. Sob o governo Costa e Silva foi promulgado o AI-5, que lhe deu poderes para fechar o Congresso Nacional, cassar políticos e institucionalizar a repressão, seja por meio de censura a órgãos de comunicação ou pela tortura de militantes.

Além do Costa e Silva - no Jardim Maria Luiza - outra escola em Cascavel leva o nome de um ditador, o Colégio Estadual Castelo Branco, no Parque São Paulo, em alusão ao primeiro presidente do regime, o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. 

Segundo levantamento do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), os 34 presidentes da história do Brasil dão nome a 3.135 escolas do ensino básico na rede pública. Destas, 976 unidades tem nomes de presidentes da ditadura militar (1964 a 1985). 

Bahia

Em fevereiro deste ano, o Governo da Bahia mudou oficialmente o nome do Colégio Estadual Presidente Emílio Garrastazu Médici para Carlos Marighella. A mudança foi motivada após solicitação de alunos, ex-alunos, professores, pais e responsáveis, além da diretoria da unidade. 

O grupo realizou uma votação em novembro de 2013 entre os envolvidos com a instituição e a partir da votação, foi encaminhado um documento oficial para que a mudança fosse efetivada. Durante a votação o nome do militante e ex-deputado constituinte baiano Carlos Marighella teve 406 votos e venceu o do geógrafo Milton Santos, que obteve 128. Houve ainda, 27 votos brancos e 25 nulos.
Ato no colégio estadual Costa e Silva
Junior, Marlon e Dionésio, integrantes da ACE